Juros de 1% ao Mês e a Modulação da ADC 58: Como Entender a Aplicação nos Créditos Trabalhistas?

O tema da correção monetária e dos juros de mora nas condenações trabalhistas ganhou grande destaque após o julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC) 58 e 59 pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Esse julgamento trouxe uma nova diretriz quanto à atualização dos créditos trabalhistas, especialmente no que se refere à substituição da Taxa Referencial (TR) como índice de correção monetária. Mas o que mudou e como ficam os juros de mora de 1% ao mês?

Neste artigo, vamos esclarecer como a aplicação da modulação da ADC 58 afeta os débitos trabalhistas, incluindo a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que confirma a possibilidade de manter os juros de mora de 1% ao mês em determinados casos.

O Julgamento das ADCs 58 e 59

Em dezembro de 2020, o STF julgou as ADCs 58 e 59, que tinham como objetivo questionar a constitucionalidade da aplicação da TR para correção monetária nos débitos trabalhistas. O tribunal decidiu que a TR não deveria ser utilizada para essa finalidade, determinando a aplicação do IPCA-E na fase pré-judicial e da Taxa Selic na fase processual, até que o legislador estabeleça novos critérios.

"O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente a ação, para conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 879, § 7º, e ao art. 899, § 4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467 de 2017, no sentido de considerar que à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho deverão ser aplicados, até que sobrevenha solução legislativa, os mesmos índices de correção monetária e de juros que vigentes para as condenações cíveis em geral, quais sejam a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil), nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. Por fim, por maioria, modulou os efeitos da decisão, ao entendimento de que (i) são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês, assim como devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês; (ii) os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento (independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC) e (iii) igualmente, ao acórdão formalizado pelo Supremo sobre a questão dever-se-á aplicar eficácia erga omnes e efeito vinculante, no sentido de atingir aqueles feitos já transitados em julgado desde que sem qualquer manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais), vencidos os Ministros Alexandre de Moraes e Marco Aurélio, que não modulavam os efeitos da decisão. Impedido o Ministro Luiz Fux (Presidente). Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber (Vice-Presidente). Plenário, 18.12.2020 (Sessão realizada por videoconferência - Resolução 672/2020/STF)."

Essa decisão impactou diretamente os créditos trabalhistas, estabelecendo novos parâmetros para a correção monetária e abrindo uma discussão sobre a aplicação dos juros de mora.

Como Fica a Aplicação dos Juros de Mora?

A decisão do STF na ADC 58 trouxe a modulação dos efeitos, ou seja, um ajuste temporal para a aplicação das novas regras. No entanto, uma dúvida recorrente é: como ficam os juros de mora de 1% ao mês, tradicionalmente aplicados nos débitos trabalhistas?

Nesse ponto, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) oferece clareza. Embora o STF tenha decidido pela aplicação da Taxa Selic para correção monetária na fase processual, os juros de mora de 1% ao mês não são afastados, especialmente quando já previstos em sentença transitada em julgado.

Jurisprudência do TST: A Manutenção dos Juros de Mora de 1%

O TST consolidou o entendimento de que a aplicação dos juros de mora de 1% ao mês pode ser mantida, mesmo após o julgamento da ADC 58.

Veja a jurisprudência sobre o tema:

AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA DO EXECUTADO - ATUALIZAÇÃO DE DÉBITO JUDICIAL TRABALHISTA - NÃO INCIDÊNCIA DE JUROS NA FASE PRÉ-PROCESSUAL - QUESTÃO COM TRÂNSITO EM JULGADO - CUMULAÇÃO DOS JUROS DE MORA COM TAXA SELIC NO PERÍODO PROCESSUAL - RESPEITO À COISA JULGADA - MARCO DEFINIDOR DO INÍCIO DO PERÍODO PROCESSUAL - DATA DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO - PROVIMENTO PARCIAL. 1. O STF, ao deslindar o tema da ADC 58 quanto à atualização dos débitos judiciais trabalhistas, fixou tese no sentido da aplicação do IPCA-E como índice de correção monetária para o período pré-processual e a Taxa Selic para o período processual. 2. No caso dos juros de mora, a legislação trabalhista também distingue os períodos (Lei 8.177/91), sendo que o caput do art. 39 da lei trata do período pré-processual ("compreendido entre a data de vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento") e o seu § 1º do período judicial ("contados do ajuizamento da reclamatória"). 3. Antes da Lei 13.467/17 ( CLT, art. 879, § 7º), à míngua de norma trabalhista específica, lançava-se mão do caput do art. 39 da Lei 8.177/91 para se fixar a TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais trabalhistas, enquanto os juros de mora seriam de 1% ao mês, com base no § 1º do mesmo dispositivo legal. Ora, a interpretação dada ao comando legal se justificava apenas enquanto não havia norma legal específica. Com a reforma trabalhista de 2017, a questão da correção monetária dos débitos trabalhistas passou a ter disciplina legal própria, razão pela qual a literalidade do art. 39, caput , da Lei 8.177/91 deve ser respeitada, porque trata específica e claramente de juros de mora e da fase pré-processual. E como apenas o § 1º do art. 39 da Lei 8.177/91 (quanto aos juros) e o § 7º do art. 879 da CLT (quanto à correção monetária) foram afastados pelo STF na ADC 58, não há como deixar de reconhecer que o ordenamento jurídico trabalhista vigente contempla juros de mora também para a fase pré-processual. 4. Contudo, no presente caso, constou expressamente da sentença transitada em julgado que "os juros incidirão a partir da data do ajuizamento da ação, observada a Súmula nº 200 do C. TST, à razão de 1% (um por cento) ao mês, de forma simples, nos termos do artigo 39, parágrafo 1º da Lei nº 8.177/91", postergando para a fase de execução apenas a fixação do índice de atualização monetária. 5. Dessa forma, em observância à formação da coisa julgada (art. 5º, XXXVI, da CF), devem ser excluídos da condenação os juros de mora relativos à fase pré-processual, assim considerado o período anterior ao ajuizamento da presente ação . 6. Por outro lado, não prospera a insurgência do Executado no tocante à cumulação dos juros de 1% ao mês, fixados pelo título executivo judicial, com a Taxa SELIC, para o período judicial, na medida em que não há como excluí-los sem violação da coisa julgada, pois transitados em julgado. Registre-se que não cabe a cisão da Taxa SELIC, a fim de ver incidente apenas o índice de correção monetária, dada a sua natureza composta (juros de mora e índice de correção monetária). No caso, a Taxa SELIC passa a corresponder, como um todo, à correção monetária. 7. Por fim, considerando que, após o julgamento da demanda por este Ministro Relator, o STF, acolhendo parcialmente os embargos de declaração opostos pela AGU na ADC 58, retificou o marco definidor do início do período processual como a data do ajuizamento da ação (Min. Rel. Gilmar Mendes, DJe de 09/12/21), o agravo também merece provimento neste aspecto, para adequar a decisão proferida nestes autos à tese vinculante do STF na ADC 58, após o julgamento dos referidos embargos declaratórios, no sentido de incidência do IPCA-E mais juros pela TR acumulada na fase pré-judicial e, a partir do ajuizamento da ação, a incidência da Taxa Selic, além dos juros de 1% ao mês determinados na sentença exequenda para a fase judicial Agravo parcialmente provido. (TST - Ag: 6841620165140141, Relator: Ives Gandra Da Silva Martins Filho, Data de Julgamento: 28/06/2022, 4ª Turma, Data de Publicação: 01/07/2022)

Esse entendimento deixa claro que a Taxa Selic pode ser aplicada como índice de correção monetária, mas os juros de mora de 1% ao mês devem ser respeitados sempre que transitados em julgado, evitando qualquer alteração nos direitos consolidados.

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